Quando se trata de arquitetura contemporânea portuguesa, frequentemente a primeira associação se faz pelo caminho da tradição. A relevância histórica do programa, a importância das tipologias para os nativos, os modos de construir. As correspondências não são infundadas, mas tampouco são restritivas, e o pequeno país tem um grande nome que prova isso: Álvaro Siza Vieira.
Siza é o maior representante da arquitetura de Portugal, e motivos não faltam. Não apenas por ser o primeiro arquiteto português a receber um Pritzker (1992), ou pela premiação do Leão de Ouro na Bienal de Veneza (2012), ou pela extensa e prolífica carreira, mas sobretudo pela atitude ao mesmo tempo particular e universal em relação à arquitetura. A atuação em território nacional e internacional explicita uma característica que muito possivelmente é de sua índole: a de ser muitos em um único, à maneira de seu conterrâneo Fernando Pessoa.
Ao mesmo tempo que sua arquitetura possui uma linguagem própria e extremamente autoral, seus projetos demonstram a variedade de repertório, soluções e experimentações formais proporcionais à longevidade de sua carreira, e a atualidade em relação às técnicas e materiais vigentes. Aliás, essas características decorrem da atitute assumida em relação à profissão. Siza não faz analogias, a arquitetura é disciplina autônoma, mas de forma alguma isolada. O arquiteto entende a multidisciplinaridade do campo, sabe a extensão de seu alcance, mas não concede aplicações ou transposições de outras disciplinas – como a linguística dos anos 1960 ou a sociologia. Para ele, arquitetura se faz na resposta construtiva apropriada ao problema colocado. Ela dialoga com estes outros campos, mas se faz tectonicamente, através do projeto, construção e técnica.
A ênfase nesta última é um ponto relevante na sua produção. A atenção aos modos de se construir é parte do que torna cada projeto único. Em Portugal, a reverência se faz pelo respeito à tradição e à cultura, mas em outros países, as particularidades construtivas informam seu projeto de modo a adaptar-se ao contexto de todos aqueles envolvidos na obra, o que também lhe confere uma gama de soluções diversas a serem assimiladas e ampliadas nos projetos futuros. Essa postura arquitetônica – entre o rigor da técnica e a flexibilidade das soluções formais e programáticas – é um legado que Siza Vieira já deixou a alguns. A produção de Carlos Castanheira segue o mesmo princípio.
Assim como Siza “tutelou” Castanheira, teve também seus próprios mestres. Durante sua graduação no Porto, o curso de arquitetura passou por uma renovação curricular encabeçada por Carlos Ramos, o que permitiu acesso dos estudantes a publicações estrangeiras que apresentavam trabalhos da imensa lista de grandes nomes da arquitetura moderna, num período em que vigorava um governo totalitário em Portugal. Além disso, Siza foi aluno de Fernando Távora, para depois tornar-se colaborador e colega de trabalho. Como se fosse tradição, o próprio Siza torna-se professor, e repete o ciclo que o formou. Entre a teoria e a prática arquitetônica, suas citações a seus pregressos e o profundo conhecimento técnico combinam-se e atualizam-se numa produção sempre em movimento e adaptação.
A atuação internacional se deu pelo contexto econômico em Portugal, que o “forçou” a construir fora. Mas o estrangeiro lhe trouxe novas técnicas, novas vistas, que certamente informam seu projetar. Muito pode-se dizer de suas implantações, de seus enquadramentos, da variedade de formas. Em Portugal ou no exterior, sua arquitetura é extremamente condizente com aquele contexto, sem nunca deixar de ser Siza.
Pavilhão de Portugal na Expo 98
Fundação Iberê Camargo
Edifício sobre a Água / Álvaro Siza + Carlos Castanheira
MIEC + MMAP / Alvaro Siza + Eduardo Souto de Moura
Museu de Arte Contemporânea Nadir Afonso
Leça Swimming Pools
Capela em Miljana
Wohnhaus Schlesisches Tor (Bonjour Tristesse) / Álvaro Siza Vieira + Peter Brinkert
Saya Park / Álvaro Siza + Carlos Castanheira
Quartel dos Bombeiros de Santo Tirso
O arquiteto foi tema do documentário SIZA, dirigido por Augusto Custódio e disponível na plataforma de streaming Gallery. O ArchDaily é parceiro da Gallery na sessão de estreia do documentário que ocorrerá em São Paulo, no MASP, em 12 de dezembro, e também no lançamento global, no dia 15 dezembro, que poderá ser assistido ao vivo.